Naquela noite eu não tinha cabeça. Um corpo com um enfeite em vez de cabeça: era eu. Sorria e me enganava. Sim, sorrir era um engano ali. Eu sorria para agradar e achava que isso podia me ser um agrado também. Sorria, sorriam de volta... Mas eu nem tinha cabeça, nem tinha mente! Ali não se importavam se eu era um enfeite, compondo o espaço, ou se eu era um pensante como eles que além de sorrir sabia falar.
Todos conversavam, todos se adoravam e todos me viam como um daqueles jarros de flores. Flores são bonitas, jarros as vezes também são. Mas naquele lugar eles, assim como eu, estavam ali, apenas estavam. Jarros de flores não interagem, ficam parados esperando as flores fazerem o papel delas. Eu estava ali como um deles, aguardando a conversadeira acabar e cansada de observar e sorrir, que era o papel do enfeite em cima do meu corpo.
Eu sempre estive cansada de me enganar e não sabia, até por que eu não tinha cabeça, não havia como pensar nisso! Aquela sala, aquela mesa, aquela felicidade; eu não fazia parte de nada daquilo e nem tinha como me encontrar. Muitos dali nem me notavam, e os que notavam pareciam saber que eu não tinha cabeça. E por que eu não tinha cabeça? Ora! Ela era o lugar do enfeite que servia pra sorrir, lembra?
Jarros não têm cabeças, a flor fica no lugar. Porém, a flor não é do jarro, nunca foi. Do mesmo modo, aquele enfeite não era meu. Eu sorria para agradar aos outros, aqueles poucos que me viam. Eu sorria para achar que podia agradar. Não era o meu sorriso! E nem minha cabeça estava ali.
Retirado do blog:www. noutroras.blogspot.com
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