Poucos dias para a finalização do calendário 2011, encontro a professora Suzana Braga e porque é propicia a ocasião, recorda-se ela de um texto que escrevi por esta mesma época.
-Eu escrevi? Indaguei.
-Sim, ela afirmou. Eu li no blog do Alacazum Palavras para Entreter.
Por alguns segundos puxei um fio da memória para evidenciar à luz desta realidade o que havia escrito naquela época. Confesso que a tentativa foi inútil. Entretanto isso foi suficiente para mobilizar-me em averiguar no blog (http://alacazum.blogspot.com/search?updated-min=2010-01-01T00:00:00-03:00&updated-max=2011-01-01T00:00:00-03:00&max-results=50 ) o que havia escrito e estimular a vontade de escrever um novo texto.
Quantas coisas ficaram adormecidas no espaço de tantos calendários vividos?
Quantas realmente doem, latejam, pulsam, estremecem, lacrimejam, roncam, gritam e explodem em nossas vidas para que ao final do ano a gente recorde?
Apenas os incômodos, as decepções, os desencantos, os constrangimentos alfinetam em nossas mentes exalando odores nauseabundos em nosso corpo ao ponto de causar gastrites, úlceras e cânceres?
Quantas vezes lançamos no lixo do esquecimento gentilezas, flores, recados deixados em papel de embrulho por alguém que aparentemente não faz parte da nossa vida?
E por que nos esquecemos de lembrar as pequenas coisas?
Por que no jogo que participamos diariamente há um bombardeamento de informações que não cabem em nosso armário alcunha cérebro.
Por que motivo, armazenar tantas coisas se a um simples comando dos meus dedos tenho o mundo diante dos meus olhos e ouvidos?
Não é apenas um antigo calendário que termina, com ele encerram-se secretas e silenciosas páginas que clandestinamente nos abordaram, mas foram arrastadas pelo vento da rotina e agora não podemos resgatá-las. Só quando alguém (este bendito ser chamado “amigo”, “amiga”) que de repente nos aborda e acende a lâmpada da recordação.
Quisera lembrar de todas as pequenas coisas que me abordaram durante o ano de 2011 e nesta passagem do 31 para o 1° como em uma retrospectiva beijar novamente, abraçar outra vez, dizer que amo olhando nos olhos e reconhecer no outro a parte mais frágil de um mesmo. Entretanto não quero parar o tempo, voltar a palavra mal dita, atrasar a ida. Tudo que foi dito ou omitido tudo que se deixou romper, desbotar, ir-se, vale para a aprendizagem do prosseguir “SEMPRE”.
O que a gente tem mesmo que lembrar é de VIVER!
Viver cada dia como se fora o último.
E amar. Amar e Malamar como disse Drummond em seus versos:
Que pode uma criatura senão,
Entre criaturas, amar?
Amar e esquecer,
Amar e malamar,
Amar, desamar, amar?
Sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso,
Sozinho, em rotação universal, senão
Rodar também, e amar?
Amar o que o mar traz à praia,
O que ele sepulta, e o que, na brisa marinha,
É sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto,
O que é entrega ou adoração expectante,
E amar o inóspito, o áspero,
Um vaso sem flor, um chão de ferro,
E o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.
Este o nosso destino: amor sem conta,
Distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,
Doação ilimitada a uma completa ingratidão,
E na concha vazia do amor a procura medrosa,
Paciente, de mais e mais amor.
Amar a nossa falta mesma de amor, e na secura nossa
Amar a água implícita, e o beijo tácito, e a sede infinita.
Em 2012, 110 anos de nascimento de Carlos Drummond de Andrade.
Texto de Celeste Martinez