domingo, 6 de julho de 2014

O Arnazém do Barrio de Daniel Cheruna


Na 357° edição do Alacazum Palavras Para Entreter, apresentação da escritora e locutora Celeste Martinez, que foi ao ar no dia 29 de junho de 2014 das 8 às 9 h apreciamos o relato de Daniel Cheruna cujo tema armazém.


O Armazém do Barrio de Daniel Cheruna

O Armazém do Barrio, estava na esquina de minha casa ( Espanha e Risso ) . Pertencia a Henrique e Pepe Camarasa; o primeiro, muito formal, porém simpático; o segundo mais robusto, não tão politicamente correto e um pouco mais jovem. Viviam os dois solteiros na casa de sua mãe já anciã. A casa que está em pé e sempre foi velha, conserva ainda todos os atributos de quando foi construida. Desabitada, resiste em abrigar seus queridos fantasmas, enfrentando com valentia o transcursso do tempo.

O enorme local que faz parte de uma construção maior, que inclui o que foi a vivenda com seu enorme patio, estava destinado a duas funções bem diferenciadas. Sobre a esquina propriamente dita, o armazém; e com entrada sobre a rua Espanha, o depósito de bebidas onde geralmente havia bicicletas encostadas sobre a parede, esperando a saida de seus donos para levá-los de volta ao lar. As vezes ziguezagueando mais que o prudente, embora as ruas de então não oferecessem demasiado risco. Mais perigosas eram as situações que costumavam apresentar-se na varanda quando alguma discurssão começava dentro do boliche e devia continuar ao ar livre por decisão de Pepe que tinha bem definido os limites da tolerância que não podia transgredir-se para permitir a permanencia dos concorrentes. Por algum motivo ele tinha este setor do negocio sobre sua responsabilidade. Sabia que se tinha que fazer-se cargo da situação aplicando sua autoridade e força bruta, não duvidaria um segundo em tomar cartas no assunto. As regras eram claras; lá fora estava o espaço público, porém ali dentro teriam que respeitar o lugar; do contrario não se permitia pisar novamente. Mas nem todos os clientes eram encrenqueiros, muitos tinham o “porre alegre” e as reuniões tornavam-se verdadeiros entretenimentos. Se palpitava um clima festivo e de camaradagem como em um clube de amigos, onde se falava de tudo e se ria muito; As vezes a alegria se tornava tão transbordante que era necessário moderar a situação para não atrapalhar os clientes que do outro lado faziam suas compras diárias em outro setor do armazem, atendido por Henrique que mantinha com elegância um lápis na orelha direita, ferramenta fundamental de sua atividade. Fazia as contas com numeros grandes e claros sobre uma folha de papel cinza que logo cortaba com a mão e fazia a função de fatura ou ticket. O mesmo papel que usava para enrolar a herva e todos os produtos soltos que eram comuns naquela epoca, como o acuçar moido ou em cubos ( que era a preferida de minha família porque diziam que adocava mais ); produtos que envolvia com uma habilidade incrivel, com bordas tipo as empanada que asegurava perfeitamente sua borda.
Depois da compra nunca faltava “la yapa” ( o caramelo ou alguma outra cortesia da casa ) e o comentário do dia era imprescindivel antes ou depois. Os dotes de comunicador social, fazia dele um experto em varias questões mais principalmente àquelas relacionadas ao tempo. A maioria fazia suas compras em cadernetas ( a negra com capa plástica e folhas com linhas e duas colunas para as anotações). Minha alegria consistia a cada tempo em comprar um alfajor e uma bolita Bilz ( limonada efervercente que conservava seu nome de quando tinha uma bolinha no gargalho para conservar seu lacre hermético)
Outra função social muito importante que cumpria o negocio dos Camarasa era seu telefone de caixão preso na parede da oficina ou deposito de mercadorias onde entravamos, desprendia o auricular, girava varias vezes a manivela fixada a direita do aparelho e dizia a operadora que nos atendia com que numero queriamos comunicar.

Existia outro na padaria em frente porem este era mais popular. Igualmente não era muito a demanda já que muito poucos tinha linha telefonica em suas casas para poder chamar-se; mas em muitos casos nos tirava de apuros e eles jamais se mostravam aborrecidos por ter que emprestar-los; inclusive deixando de atender alguém para guiar-nos até o lugar exato. Para o qual era necessario levantar uma tabua de madeira do mostrador e atravessar o setor do bar saudando atentamente a quem ali estivesse. Tenho em minha mente os altos tetos, o reboco de barro e os pisos de tijolo vermelho. As vitrines de madeira dura e escura como os enormes mostradores e as estantes que cobriam praticamente toda a parede, exibindo tanto comestivel como caldeirões, baldes e bacias. Praticamente um armazém de ramo geral. Do mesmo modo que conservo a recordação dos cheiros, mistura de especieis com umidade que fazia único e reconhecivel o ambiente mesmo com os olhos fechados. Os irmãos eram muito queridos. E eles sabiam; por isso tinham aparentemente uma vida feliz. Sabiam que estavam cumprindo uma importante missão para o seu bairro. Hoje, podem descansar em paz, seguros de que, quem compartilhou essa etapa; os recordaremos sempre e lhes estaremos infinitamente agradecidos por tudo que nos deram.


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