Na 267° edição do programa radiofônico ALACAZUM PALAVRAS PARA ENTRETER que foi ao ar no dia 13 de maio de 2012 das 8 às 9 da manhã de domingo, transmissão Rio Una FM 87,9 apreciamos na abertura do programa a poesia: Mãe Didi de Cora Coralina, contida no livro: Meu livro de cordel.
Mãe Didi
Alguns perguntam pela minha vida, pelo embrião primário,
de como veio e se encontrou comigo a minha poesia,
a presença primeira do meu primeiro verso; eu respondo:
Ela cascateia há milênios.
Minha Poesia... Já era viva e eu, sequer nascida.
Veio escorrendo num veio longínquo de cascalho.
De pedra foi o meu berço.
De pedras têm sido meus caminhos.
Meus versos:
pedras quebradas no rolar e bater de tantas pedras.
Dura foi a vida que me fez assim. Dura, sem ternura.
Dolorida sem sentir a dor.
Ausente sem sentir a ausência.
Distante tateando na distância.
Tudo cruel. Todos cruéis.
Impiedosos.
Em torno, o abandono.
Aninha, a menina boba da casa.
Foi uma ex-escrava que me amamentou no seu seio fecundo.
Eram seus braços prazenteiros e generosos que me erguiam, ainda rastejante, e Aninha adormecia, ouvindo
estórias de encantamento.
Minha madrinha Fada...
Eu era Aninha Borralheira.
Era ela que me tirava da cinza
e me calçava sapatinhos de cristal.
Me vestia. Me carregava na Procissão.
Eu adormecia na cadeirinha de seus braços.
E sonhava que era um anjo de verdade
aconchegada na nuvem macia de seu xaile.
Toda a melhor lembrança da minha puerícia distante está ligada a essa antiga escrava.
Na tarde da minha vida assento o seu nome na pedra rude do meu verso: Mãe Didi.
Para você, Mãe Didi, está página sem brilho
do meu Livro de Cordel.
Cora Coralina
Un poema de Alina Diaconú
Há 5 dias
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