A Cristaleira da mãe de Ivonete
Simpática, forte, começando a
grisalhar, era assim a mãe de Ivonete, a dona da cristaleira. Chamava-se D.
Onélia. Morava no começo do Pasto da Fonte; hoje, rua Sete de Setembro.
Não sei o que minha mãe foi fazer
lá. Do que me recordo é que, passados os momentos das apresentações e timidez,
Ivonete apareceu, trazendo quatro ou cinco companheiras, moradoras das
proximidades. Todas, não passávamos de sete a nove anos de idade.
Coincidentemente, cultivávamos os mesmos gostos, as mesmas inclinações:
pintanças.Éramos lideradas pela filha da dona da casa.
Enquanto os adultos conversavam,
começamos a trabalhar. Contamos estórias, jogamos baralho, brincamos de roda...
Até aí, tudo bem! Acontece que o tédio foi tomando conta de todas nós. Muita
monotonia para umas pirralhas com tanta energia acumulada e que já precisavam “
esquentar as turbinas”.
Foi então que um dos “anjinhos” (
sei lá se fui eu) sugeriu: - vamos brincar de “picula”. Aclamado por unanimidade,
foi eleito o arcanjo-mor, que logo passou a ditar as regras do jogo. Por
exemplo: estaria “piculado”, o Serafim que triscasse a cristaleira.
A brincadeira repetia-se,
continuava... A gritaria também... Uma delícia! Um paraíso na terra.
No calor do corre-corre, do
pega-pega pra não deixar “picular”, um dos anjinhos não triscou, empurrou a
vidraceira, quero dizer, a cristaleira é que tombou, quebrando tudo que havia
dentro, fora e sobre...
Foi um
Deus-nos-acuda!... Eu não fui..., nem eu...., eu também, não... De repente,
todo mundo escafedeu. Sabem pra quem sobrou? Claro! Pra mim, que não tive pra
onde correr.
Tadinha da
mamãe! Teve que assumir, sozinha, o prejuízo da cristaleira e de todos os
“cristais”.
Fui dormir
naquela noite com a bunda quente, por certo vermelha, pelas palmadas que levei
ao chegarmos em casa. Acho até que, por essas e tantas outras a que já havia me
acostumado, fiquei “ desbundada”, melhor dizendo, para não fugir ao significado
correto da palavra, sou, em algumas oportunidades, desbundada.
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