Huguenote era o apelido que na Idade Média os católicos franceses davam aos protestantes, especialmente os calvinistas. A partir de 1561, e até 1598, esses dois grupos religiosos agitaram e incendiaram seu país com desavenças e conflitos provocados pela absoluta intransigência na aplicação dos diferentes princípios doutrinários que os dois lados tinham como verdadeiros, um defendendo a Santa Liga, entidade fundada com o propósito de preservar a religião católica contra os protestantes, e outro, apesar dos reiterados juramentos de fidelidade feitos ao rei, pretendendo estabelecer uma teocracia, sistema de governo em que os chefes do Estado, quando não sacerdotes, são considerados ministros de Deus, ou dos deuses.
Entre os líderes destes últimos estava Gaspar II de Coligny (1519-1572), um militar francês altamente considerado pelo rei Carlos IX (1550-1574). Mas Catarina de Médicis (1519-1589), mãe do rei, mostrava-se a cada dia mais receosa do poder crescente que Coligny, um homem extremamente severo e de hábitos austeros, tinha em suas mãos, e por isso mesmo, preocupada em conservar a sua própria força, começou a tramar contra o militar e seus companheiros de religião. Sendo assim, e para se inteirar das conversas que aconteciam nos cômodos do palácio, ela mandou preparar uma rede de escuta com furos feitos de forma disfarçada nas molduras dos quadros, nas paredes e nos tetos, o que fez nascer entre os freqüentadores da corte o aviso prudente de que “as paredes ouvem”, como forma de um alertar a outro sobre o cuidado que deveria ser tomado naquilo que poderia ser dito, para evitar qualquer tipo de comprometimento.
No final dessa história de intrigas a rainha-mãe acabou vencendo. Uma noite, o almirante Coligny foi ferido quando deixava o palácio, e dois dias depois, em 24 de agosto de 1572, acabou sendo assassinado em sua própria casa por um alemão chamado Besme, que atirou seu corpo pela janela e depois o dependurou na forca, para que ficasse exposto ao povo. Nessa mesma noite, véspera do dia de São Bartolomeu, os huguenotes foram caçados de casa em casa, não só em Paris como no resto da França, tendo 50.000 deles morrido nesse massacre. A perseguição promovida por Catarina de Médicis fez com que os huguenotes emigrassem em grande escala para diversos países, em busca de segurança. Por isso o almirante Nicolau Durand de Villegaignon (1510-1571), quando em 1555 alcançou a cidade do Rio de Janeiro com dois navios, e desembarcou seus homens na pequena ilha que até hoje conserva seu nome (ao lado do atual aeroporto Santos Dumont), aqui chegou com a intenção determinada de organizar um refúgio seguro que pudesse abrigar os protestantes perseguidos em sua terra.
Essa é a origem da expressão “as paredes têm ouvidos”, que serve para indicar a possibilidade da existência de ouvidos indiscretos prestando atenção no que se conversa. Principalmente nos dias de agora, quando sofisticados sistemas de escuta conseguem captar e registrar tudo o que as pessoas estão dizendo até mesmo em ambientes considerados seguros.
FERNANDO KITZINGER DANNEMANN
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