- E aí, minha conterrânea!?
O supermercado lotadíssimo e ele
gritou-me proferindo esta simples frase para que todos ouvissem,
quebrando as regras de etiquetas vigentes. Eu o saudei, acenando,
enquanto me organizava na fila do caixa que dizia até no máximo 10
ítens. Ele aproximou-se. Carregava dois capacetes, em uma das mãos e na
outra uma sacola plástica, deste tamanho, contendo carne vermelha.
Estava tão pesado, que seu corpo inclinava para o lado. Baixinho, semi
desprovido de cabelos, amigo dos tempos em que vivia na Gamboa do Morro
Cairu Bahia. Sempre foi muito alegre e festivo. Todos que o conhecem
gostam dele. Trabalhou desde cedo na comercialização de mariscos. Chegou
a ter peixaria em Valença. Formou família e descasou. Agora vive, como
ele mesmo diz: Nas cachaças. Curte uma pinga no pé do balção. É dele a
expressão: Adorooooooo!
- E a Gamboa, continua linda? Perguntei-lhe.
- Agora eu sou visitante. Muita gente daquele nosso tempo já se foi.
Não conheço mais ninguém. Disse e seu rosto se expressou com tristeza.
- Visitante nativo. Acrescentei.
- E você, quantos anos que saiu de lá? Perguntou-me
Calculei momentaneamente uns trinta anos. E ele:
- Eu tenho quarenta anos de Valença.
A fila emperrara e ele impaciente, devido ao peso que carregava, de repente olhando para trás, disse:
- Venha, cá, Bié!
Um ancião, franzino, com chapéu de vaqueiro, sandálias de tiras e
roupas surradas, aproximou-se, bem, bem lentamente. Olhei para o homem e
pareceu-me conhecido. Perguntei:
- Ele é da Gamboa?
- Não. É
daqui de Valença, da rua da Triana. Meu companheiro das cachaças. Tá
vendo aqui? E desviou os olhos para a sacola de carne que segurava em
uma das mãos. É dele! Tô fazendo um favor. Até disse, que levava ele de
moto. Ele é que não quer.
Falava em um volume de voz que excedia
os cinquenta decibéis permitidos. Todos os olhares em nossa direção e
alguns sorrisos.
De repente, umas quatros pessoas que estavam
posicionadas em minha frente, optaram por dar passagem a este meu amigo,
com uma sacola, deste tamanho, cheia de carne. O senhor o acompanhava,
arrastando os pés e olhando para o chão com medo de cair.
- Tchau, minha amiga! Ele disse.
Só balancei a cabeça e esbocei um sorriso. Naquele momento, por minha
mente passavam vários capítulos da infância em Gamboa. E me transportei
para a rua de cima, lugar onde este meu amigo morava.
Enxerguei o
campo da bola, a discoteca de Cabinho, aquele homem magrinho com andar
compassado, chamado Zezinho Galo, a pequenina delegacia de polícia,
Baco, Alfonso, o prédio escolar bem em frente a praia, a casa de
Paizinho ( o músico) Tita, Norma, Dona D' Hora, Nilena ( e seu amor
exarcebado aos filhos e filhas ), professor Júlio com sua elegância e
cordialidade ( ainda escuto o tom grave da sua voz ) professora Lilita,
sempre muito educada, prestativa e severa, a sorveteria de... como era
mesmo o nome daquela senhora?
Ah! Gamboa, quanta saudade!
Valença 10 de maio de 2017 Celeste Martinez
Un poema de Alina Diaconú
Há 5 dias
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