domingo, 25 de maio de 2014

A câmara das estátuas de Jorge Luis Borges

Na 352° edição do Alacazum Palavras para Entreter, apresentação da escritora e locutora Celeste Martinez e que foi ao ar no dia 25 de maio de 2014, das 8 às 9 h da manhã de domingo, transmissão ao vivo 87,9 Rio Una FM, cujo tema: Escritores e poetas que perderam a visão; apreciamos o conto: A câmara das estátuas de Jorge Luis Borges, retirado do livro: Historia Universal de la Infamia, Alianza Editorial

A câmara das estátuas

Nos primeiros dias, havia no reino dos andaluzes, uma cidade em que residiram seus reis e que tinha por nome Lebtit ou Ceuta ou Jaén. Havia um forte castelo na cidade, cuja porta de dois batentes não era para entrar nem para sair, senão para que permanecesse fechada. Cada vez que um rei falecia e outro rei herdava seu altíssimo trono, este, acrescentava com suas mãos uma fechadura nova na porta, até alcançar vinte e quatro fechaduras por cada rei. Aconteceu então, que um malvado homem, que não era da casa real, se apropriou do poder e em lugar de acrescentar uma fechadura, quis que as vinte e quatro anteriores fossem abertas para olhar o interior daquele castelo. O visir e os emis, suplicaram que não fizesse tal coisa e lhe esconderam o chaveiro de ferro e lhe disseram que colocar uma fechadura era mais fácil que forçar vinte e quatro. Porém, ele, repetia com maravilhosa astúcia: " Eu quero examinar o interior deste castelo". Então lhe ofereceram quantas riquezas podiam acumular, em rebanhos, em ídolos cristãos, em prata e outo, porém, ele, não quis desistir e abriu a porta com sua mão direita - que arderá para sempre- Dentro estavam desenhados os árabes em metal e em madeira, sobre seus rápidos camelos e potros com turbantes que ondeavam sobre a espalda e foices suspensas em couros e a direita, lança na esquerda. Todas as figuras eram fantasmas e projetavam sombras no piso e um cego podia reconhecê-las mediante o tato. E as patas dianteiras dos camelos não tocavam o solo e não caiam como se estivessem alçados. Grande espanto causaram no rei estas primorosas figuras e  ainda mais, a ordem e o silêncio excelente que se observava nelas, porque todas olhavam para o mesmo lado, que era o poente e não se ouvia nem uma voz, nem clarín. Isso havia na primeira câmara do castelo.
Na segunda estava a mesa de Solimán, filho de Davi - seja para os dois a salvação - talhada em uma só pedra esmeralda, cuja cor, como se sabe,é verde, e cujas propriedades escondidas são indescritíveis e autênticas, porque serena as tempestades, mantem a castidade de seu portador, afugenta a disenteria e os maus espíritos, decide favoravelmente em litigio e é de grande socorro nos partos.
Na terceira, acharam dois livros: um era negro e ensinava as virtudes dos metais e dos talismãs e dos dias assim como a preparação de venenos e de contra- venenos; o outro, era branco e não se pode decifrar a sua ensinança  embora a escritura  fosse clara.
Na quarta, encontraram um mapa mundi, onde estavam os reinos, as cidades, os mares, os castelos e os perigos, cada qual com seus nomes verdadeiros e com sua precisa figura.
Na quinta, encontraram um espelho em forma circular, obra de Sulimán, filho de Davi - seja para os dois, a salvação - cujo preço era muito , pois estava feito de diversos metais e quem se mirava em sua lua via os rostos de seus pais e de seus filhos desde o primeiro Adão até os que escutaram a trombeta. 
A sexta, estava cheia de elixir, o que bastava um só adarme para trocar três mil onças de prata em três mil onças de ouro.
A sétima, lhe pareceu vazia e era tão larga que o mais hábil dos arqueiros houvesse disparado uma flecha desde a porta sem conseguir clavá-la no fundo. Na parede final viram gravada uma inscrição terrível. O rei, a examinou e compreendeu. Dizia o seguinte:
Se alguma mão abre a porte deste castelo, os guerreiros de matal da entrada, se adentrarão ao reino.
Estas coisas aconteceram no ano 89 da hégira. Antes que chegasse a seu fim, Tárik, se apropriou desta fortaleza derrotou esse rei e vendeu suas mulheres e filhos e desolou suas terras. Assim se foram afastando os árabes do reino de andaluzia, com sua figueiras e pradarias regadas em que não se sofre de sede. A respeito dos tesouros, é fama que Tárik, filho de Zaid, os enviou ao Califa, seu senhor que os guardou em uma pirâmide.

Do livro: as 1001 noites. Noite 272. Jorge Luis Borges

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