quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

A peleja da Ciência com a Sabedoria Popular


Enquanto a mensagem culta
Somente atinge a nata
Não chega ao conhecimento
Do povo humilde, da massa
A poesia popular
Se propõe a informar
Pra não lhes deixas às traças.
Se a poesia culta
Vista do lado eufórico
Obedece piamente
Sempre um momento histórico
A poesia popular
É capaz de retratar
Até os atos heróicos.
A importância, por exemplo
Do jumento, no Nordeste
Como irmão do próprio homem
O jegue é cabra da peste
Que tudo faz, de serviço
Considerado por isso
O imperador do agreste.
As gestas de bois famosos
Por astúcia e esperteza
Não se deixando pegar
Não dando sopa, moleza
Vencendo sempre o vaqueiro
Que busca lhe ver cabreiro
No curral ou sobre a mesa
Os heróis dos cantadores
Não são os bonzinhos, não
São os ditos: ante-heróis
Nascidos lá no sertão
Comandantes do cangaço
Ameaça dos ricaços
Lutando por água e pão.
É o padim Pade Ciço
João Grilo, Frei Damião
É o Antonio Silvino
É Corisco, é Lampião
É o Pedro Malazarte
Ferrabrás, cheio de arte
Pedro Cem, é o Canção
É um cachorro que morre
Após perder o seu dono
Cuja tristeza tamanha
Lhe tira apetite e sono
Vai morar no cemitério
Se transforma num mistério
Passível de estudo longo
O diabo, no sertão
Não faz tanto mal, assim!
É até bem generoso
Não é de todo ruim
Assume a forma humana
Quando lhe ferem, reclama
Não tem nada de Caim
Para que prova maior
De perfeito entrosamento
Que o cansanção com o bode
O nordeste com o jumento
O cantador com a lida
A dor com a triste partida
O forró com o lamento?...
Livro: A peleja da Ciência com a Sabedoria Popular de Antonio Vieira



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