sexta-feira, 19 de junho de 2009

O céu de noite


O Texto: “O céu de noite” de Monteiro Lobato, lido na 132° edição do programa radiofônico ALACAZUM PALAVRAS PARA ENTRETER que foi ao ar no dia 14 de junho de 2009, transmissão pela Rádio Clube de Valença 650 Khz AM.

Pedrinho não tirava os olhos das estrelas da Constelação do Centauro.
-Por que, vovó, deram o nome de Centauro àquelas estrelas? Que relação há entre elas e os monstros meio cavalos e meio homens da mitologia grega?
Dona Benta assoprou.
- Ah, meu filho, os astrônomos, que são homens de muita imaginação, acharam que uma linha ligando todas as estrelas desse grupo lembra a forma dum Centauro.
-Mas lembra realmente?
-Olhe e decida por si mesmo – e Dona Benta indicou as primeiras estrelas da Constelação do Centauro. Pedrinho ligou-as com uma linha imaginária e não viu formar-se centauro nenhum.
- Estou vendo, vovó, que os astrônomos possuem ainda mais imaginação do que a Emília.
- E assim são as linhas que você tirar de todas as outras constelações – continuou Dona Benta. – Umas dão uma vaga idéias de qualquer coisa; outras, só com muita força de imaginação lembram as coisas indicadas pelo nome. Temos ali ( e o seu dedo apontava ) a Constelação do Pavão. E temos aquela ali que é a do Tucano... Ah, meus filhos, não há nada mais poético do que a astronomia, ou ciência dos astros! Está aí uma aventura que vocês podem realizar um dia; um passeio pelas constelações!... Que lindo! Podiam começar pela Estrela Polar, que nós não vemos daqui mas que para as criaturas humanas é a mais importante.
-Por que, vovó?
-Porque foi a bússola das mais antigas civilizações. Os egípicios, os babilônios, os chineses, os hindus, todos os velhos povos ao norte do equador, guiavam-se por essa estrela, que está sempre visível e marca o pólo. Fica bem em cima do Pólo Norte. E perto dela ficam duas constelações muito célebres, a Ursa Menor e a Ursa Maior.
-Por que têm esses nomes?- quis saber Narizinho.
- Porque os mais antigos astrônomos lhe deram esses nomes. Não podiam dar o nome de Tucano ou qualquer bicho das zonas quentes, próximas do equador. Deram-lhe o nome do animal que gosta de viver nos gelos – o urso polar. Por essa estrela se guiavam os navegantes do norte, no tempo em que não havia a bússola. Depois da bússola os navegantes dispensaram as estrelas – a agulhinha da bússola está sempre voltada para o norte.
- E as outras constelações?
-Ah, meu filho, há tantas... E inúmeras designadas por meio de nomes de animais, como as do Escorpião, do Leão, do Cavalo, do Carneiro, dos Peixes, do Cisne, da Lebre, da Hidra, do Corvo, do Peixe Voador, da Abelha, da Ave do Paraíso, da Girafa, da Raposa, do Lagarto, da Rena, do Gato...
- E a tal cabeleira de Berenice, que a senhora falou tanto outro dia? – quis saber Pedrinho.
-Ah, essa constelação tem um nome muito romântico. Trata-se duma historia meio compridinha.
- Conte, conte – pediram todos- e Dona Benta contou a história dos cabelos da princesa Berenice, esposa de Ptolomeu Evergete, rei do Egito.
- Este Ptolomeu – disse ela – havia partido à frente duma expedição guerreira contra a Síria; e tomada de medo, Berenice fez à deusa Vênus a promessa de cortar a sua linda cebeleira e depositá-la no templo da deusa, caso Evergete voltasse vivo e vitorioso. Ora, o rei voltou vivo e vitorioso e a rainha cumpriu o voto: cortou os cabelos e depositou-os no templo da deusa. Mas aconteceu uma coisa inesperada: no dia seguinte a cabeleira havia desaparecido do templo!... E vai então, um astrônomo da ilha de Samos, que acabava de descobrir no céu uma nova constelação, mandou dizer ao rei que a cabeleira de Berenice estava lá: eram as sete estrelas que ele havia descoberto entre as constelações do Leão e de Arturus – e deste esse tempo o grupo das sete estrelas passou a ser conhecido sob o poético nome de Cabeleira de Berenice.
- Que lindo! –exclamou a menina.
-Quando eu tiver uma gatinha, vou botar-lhe o nome de Berenice.
-Há constelações de nomes ainda mais curiosos – continuou Dona Benta- como a da Coroa, da Lira, da Flecha, do Altar, da Balança, do Relógio, do Telescópio, da Oficina Tipográfica, etc. E hão as de nome poético, como essa da Cabeleira de Berenice, a da Pomba de Noé, a dos Cães de Caça, a da Harpa de Jorge, a do Buril do Gravador, a do Escudo de Sobieski, a do Coração de Carlos II, a da Cabeça de Medusa, a do Homem Ajoelhado, etc. E há a de Sírio ou de Cão Maior, onde aparece a mais bela estrela do nosso céu, afastadíssima de nós. Imaginem que Sírio está a mais de 81 trilhões de Km de distância – isto é, a 540 mil vezes a distância entre a Terra e o Sol...
- E qual é a distância entre a Terra e o Sol?
-É de mais de 150 milhões de quilômetros. Sírio está tão longe de nós que sua luz gasta quase 9 anos para chegar até aqui – e no entanto a velocidade da luz é uma coisa louca. Vamos ver quem sabe qual é a velocidade da luz. Eu já contei.
Pedrinho lembrava-se
- É de 300 mil quilômetros por segundo – disse ele.
- Por segundo? – admirou-se Narizinho. – Então enquanto eu pisco os olhos a luz vai daqui até... até... Trezentos mil quilômetros é daqui até onde, vovó?
-É fora deste nosso mundinho, menina, porque você bem sabe que só com 40 mil quilômetros a gente já dá a volta em redor da Terra.
- Então quer dizer que, enquanto eu abro e fecho os olhos, a luz faz 7 vezes e meia a volta da Terra?
- Isso mesmo.
-Puxa! Já é ser apressadinha...
- É que a luz tem botas de 300 mil léguas – lembrou Emília. – Imaginem o coitadinho do Pequeno Polegar, com suas botinhas de 7 léguas, apostando corrida com a luz! Enquanto ele dava um passo, a luz dava 7...
- Sete o que Emília?
- Sete voltas em redor da terra. Maior danada não pode existir.


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