Vale a pena lembrar que no primeiro quarto do nosso século, Praga era uma cidade de intensa vida cultural e muita agitação política. Kafka costuma frequentar reuniões anarquistas no Klub Mladých ( Clube dos jovens) e chega a elaborar um projeto de organização de uma comunidade de trabalhadores não-proprietários, na qual gostava de viver. (...) Praga, onde se misturava o pesado odor do passado imperial com o sopro dos novos ventos republicanos, era considerada o paraíso dos burocratas. O instituto onde Kafka trablhava era uma dessas empresas hierarquizadas onde a burocracia servia ao absurdo e não aos seres humanos. Mais de trinta mil fábricas da Bôemia encaminhavam os seus empregados acidentados ao instituto, onde estes infelizes eram transformados em números e fichas que percorriam o interminável ritual de passagem de uma sala para outra, pelos longos corredores, subindo e descendo cansativas escadas, para que, no fim, repousassem nos arquivos bolorentos, enquanto os acidentados esperavam, às vezes, vários anos por uma indenização. Além da constante percepção de desumanidade da complexa máquina burocrática, Kafka é marcado de uma maneira inconfudível pela atmosfera misteriosa de uma Praga gótica, sua ruazinhas estreitas e sinuosas, casarões, pátios, praças, igrejas, sinagogas, escritórios sinistros cheios de papéis empoeirados, cais do rio Moldava, jardins barrocos, lendas e tradições.
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